sábado, 28 de outubro de 2017

Culpas Modernas



Culpa. É o sentimento que persegue o pensamento das mães de hoje. Falta de tempo, atividades e serviços deixados pela metade.Tudo feito da maneira que dá. Mil coisas ao mesmo tempo. Pouco descanso, muitos compromissos. Carga horária de trabalho puxada. Estímulos externos. Overdose de tecnologia. Hiper-conectividade. Super mulher. 

Sim, tudo isso acontece na vida de uma mulher, todos os dias. Ela não tem tempo para refletir ou descansar. Não tem tempo para deixar o colarinho da camisa do marido bem passada, ou de preparar o bolo preferido da filha. Não consegue mais manter a casa organizada, a pia sem louça, recolher a roupa assim que seca. Essa mulher acorda antes das seis horas e dorme depois da meia noite. E no seu tempo livre, que é pouquíssimo, ela tem que se empenhar em ser melhor, estudar, crescer no trabalho, ou não sustenta sua casa. O marido precisa de apoio.

Saudade do meu tempo de criança. Minha mãe não trabalhou fora sempre. E quando trabalhava, a carga horária era mais leve. Minha mãe tinha tempo pra tudo: pra cuidar de mim, do meu pai, da casa e de si mesma. Nossa casa estava sempre bonita, limpa. Meu cabelo penteado, sempre de roupinhas bem passadas. Meu pai chegava em casa e tinha comidinha quente. E pensa que ela era uma Amélia, que só cuidava da gente? Não! Minha mãe se cuidava. Andava bonita, fazia as unhas, cuidava de sua aparência. Lia seus livros, fazia cursos. Minha mãe tinha tempo para ela. Tinha tempo pra família. E como tive uma infância feliz! 

Mas hoje, a culpa acorda com a gente. E dorme também. De manhã é a culpa por ter dormido tarde e ter deixado alguma coisa por fazer. A culpa de não tomar um bom café, por não dar tempo. A culpa de não ter preparado um lanche caseiro pra filha que vai pra escola e dar uns trocados para comprar salgados que não são nada saudáveis. A culpa de não conseguir passar todas as roupas do filho, ou de de deixar os panos de prato de molho. A culpa de não conseguir fazer salada no almoço e às vezes nem de cozinhar algo diferente. Porque o almoço precisa ser rápido. A culpa de não conseguir ir sempre fazer seus exercícios, porque outros compromissos aparecem. A culpa de ter esquecido de tomar o remédio. A culpa de ter esquecido o remédio do filho. A culpa de ter se atrasado, de ter esquecido alguma coisa no outro lado da cidade e ter que voltar para buscar. A culpa de ir dormir tarde porque precisou adiantar coisas que não teve tempo durante o dia e ter que comprar uma pizza ou um lanche para a janta da família. A culpa bendita de não responder seu amigo na rede social, de não ter tempo para bater papo com ele, e nem de poder ir à sua casa fazer um churrasquinho. A culpa de não ter feito as unhas ou comprado uma blusa nova para um evento, ou de não ter ajudado sua filha a se arrumar e ficar mais bonita do que já é. A culpa de trabalhar tanto e conseguir tão pouco. 



Será que minha mãe, ou minha avó, sentiam essas culpas? Algumas creio que sim. Mas a maioria são culpas modernas. São aqueles problemas que nós mesmos criamos. O ser humano evoluiu com a tecnologia e com a mesma está se destruindo. Ela nos ajuda, mas se usada com sabedoria. A maioria dos compromissos que temos hoje, nem existiam na época de nossos pais. Minha mãe me deixava ir pra escola de ônibus e não sabia se cheguei bem, pois não existia celular. Ela tinha que confiar. Em mim,em Deus. Só digo que nunca deixei de tranquilizá-la. Se perdia o ônibus ou me atrasava, corria pro orelhão e avisava. 

Espero que as mães de hoje recebam uma indulgência. Pelos seus pecados. Pelas suas culpas, pelo que fazem e pelo que não fazem. Pelo tempo que não tem e pelo tempo mal usado. Que seus filhos as perdoem e que tenham menos culpa quando forem pais. Que aprendam a usar melhor o tempo, em coisas realmente importantes. Que a próxima geração de pais não sinta tanta culpa. 

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